Eliane Prolik e José Bechara: Intersecções obtusas

 

Deitando dois conceitos matemáticos e dispondo-os como ferramentas poéticas, a exposição Intersecções obtusas busca aproximar trabalhos recentes de Eliane Prolik (Curitiba, 1960) e José Bechara (Rio de Janeiro, 1957), artistas que operam dispositivos geométricas a fim de tecer narrativas essencialmente humanas, contemplativas e questionadoras acerca de seu tempo. Suas produções, portanto, se interseccionam: não de maneira incisiva e cortante, mas em múltiplos caminhos obtusos, vastos e irrestritos.   

Nessa ocasião, Eliane Prolik apresenta esculturas metálicas resultantes de processos de dobras, angulações e obliquidades em tubos de aço inoxidável. Linhas se constroem e se metamorfoseiam em entidades escultóricas que provocam o espectador e ativam o espaço. Em oposição a uma geometria cartesiana e hermética, a artista endereça possibilidades experimentais na prática escultórica, a confluir atento rigor, sensibilidade e profunda erudição. 

Suas obras desobedecem a uma ortogonalidade limitante e se relacionam com leituras abertas do mundo contemporâneo: embora registrem as torções do dia-a-dia, os impasses e embates que incidem sobre as formas, ensaiam uma expansão com seus múltiplos cotovelos a romper o espaço modular. Em suas esculturas de parede, nota-se um avanço: as obras se projetam, em um ímpeto passional a inflamar a tranquilidade dos planos arquitetônicos. Sinal outro da atenção da artista à polivalência contemporânea é o combate a uma frontalidade estrita: suas obras resistem a um ponto de vista oficial, a uma tentação disciplinar que poda o olhar e que restringe as propriedades múltiplas da tridimensionalidade. Formam-se e deformam-se fractalmente, com várias faces ao passo que nenhuma oficial. 

Seja nas dinâmicas entre obra e espaço expositivo, seja nos aspectos intrínsecos à arquitetura transpostas à escultura, suas obras enfatizam as relações com o espaço arquitetônico. A superfície polida e espelhada do aço inoxidável mimetiza o espaço e amalgama o observador, replicando suas imagens em seus reflexos distorcidos. Esse aspecto reforça fluxos fenomenológicos dos trabalhos, dispondo-os abertos e penetráveis espacial e visualmente, incentivando o movimento do espectador ao seu redor e a fruição em vários ângulos. Desse modo, o olho percorre o objeto e o identifica em seu próprio reflexo mutável. 

As discussões espaciais movimentadas por José Bechara em suas grandes esculturas e instalações são canalizadas, nessa exposição, em suas pinturas com oxidação de emulsões metálicas, cobre e ferro, tinta acrílica e lonas usadas de caminhão. A variação de plataformas reitera a constância de uma preocupação sobre o acúmulo e o vazio, o excesso e a síntese, limítrofe às compreensões virtuais do espaço. Em suas obras, o dinamismo formal veloz colide radicalmente com um processo demorado, com etapas que guardam semelhanças com meticulosas práticas laboratoriais, ao passo que são igualmente contemplativas, existenciais. 

Há, portanto, uma declaração imediata: o espaço não é estático, mas é habitado, revirado, corroído. O artista propõe arranjos entrópicos orquestrados, onde o acaso não se encontra por sorte, mas por exaustão experimental. Infiltrações e embaralhamentos em espaços puros através de composições dramáticas e inquietas questionam pressupostos acerca da espacialidade – não de modo a solucioná-la, mas a questioná-la, a negar as imposições cisalhantes que lhe foram historicamente atreladas. Desse modo, Bechara revisita cânones do abstracionismo geométrico sem a milimétrica frieza minimalista, mas em uma pulsão expansora e rompante. 

De forma conciliatória, o artista emprega meticulosas práticas químicas a serviço de investigações acerca da existência, da impermanência do tempo, da inconstância do espaço, das oportunidades contemplativas em meio a turbilhões. Sensivelmente, decreta a vida ativa nos óxidos, nas reações químicas, assim como a ação do tempo e as histórias imantadas nas lonas de caminhão que utiliza como suporte discursivo. 

Além das convergências metálicas, da materialidade do aço inoxidável maciço das esculturas de Prolik às oxidações metálicas das pinturas de Bechara, os trabalhos atestam expansões poéticas dos consagrados artistas que comungam um cerne gramatical. Arestas, encontros e quinas tornam-se afáveis pela inflexão poética, na afirmação de experimentações a geometrias sensíveis, humanas e vivenciáveis. 

 

Mateus Nunes

José Bechara | Bookmaker, 2015

acrílica, oxidação de cobre e ferro sobre lona e lona usada de caminhão

145 x 265 x 3,8 cm

Eliane Prolik | Sem Título, 2024

aço inox (19 mm)

141 x 154 x 90 cm

Eliane Prolik | Sem Título, 2024

aço inox (19 mm)

310 x 190 x 145 cm (2 peças encaixadas)

Eliane Prolik | Sem Título, 2023 | Sem Título, 2023

aço inox (19 mm)

87 x 170 x 115 cm | 90 x 234 x 128 cm

José Bechara | Sem Título, 2024

acrílica, oxidação de cobre e ferro sobre lona

100 x 175 cm

José Bechara | Sem Título, 2022

oxidação de emulsões metálicas e acrílica sobre lona usada de caminhão

80 x 65 cm

José Bechara | Sem Título, 2022

oxidação de emulsões metálicas e acrílica sobre lona usada de caminhão

104 x 94 cm

José Bechara | Sem Título, 2021

oxidação de emulsões metálicas e acrílica sobre lona usada de caminhão

80 x 65 cm

José Bechara | Sem Título, 2021

oxidação de emulsões metálicas e acrílica sobre lona usada de caminhão

80 x 65 cm

Eliane Prolik | Sem Título, 2024

aço inox (19 mm)

112 x 94 x 84 cm

Eliane Prolik | Sem Título, 2024

aço inox (19 mm)

68 x 113 x 107 cm

José Bechara | Sem Título, 2024

ácrílica e oxidação de ferro sobre lona

120 x 115 cm

José Bechara | Sem Título, 2024

acrílica e oxidação de cobre sobre lona

120 x 115 cm

Eliane Prolik | Sem Título, 2023

aço inox (19 mm)

90 x 159 x 123 cm

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