Ione Saldanha
Ione Saldanha (Alegrete, 1919 - 2001), pintora e escultora nascida no Rio Grande do Sul, iniciou seus estudos no ateliê de Pedro Araújo, no Rio de Janeiro, em 1948. Viajou para a Europa em 1951, estudando a técnica de afresco em Paris (na Academie Julian) e em Florença. A artista desenvolveu um trabalho intuitivo, explorando diversos suportes como tela, papel, ripas de madeira, bambus, bobinas e, por fim, tocos de madeira empilhados.
Com quase seis décadas de produção, sua obra foi marcada por rigor e coerência, com cada série de trabalho desdobrando-se rumo à próxima – partindo das pinturas figurativas iniciais dos anos 1940 aos trabalhos abstratos dos anos 1950, chegando às pinturas em suportes tridimensionais a partir do final dos anos 1960. A verticalidade foi constante em sua produção, como notaram diversos críticos. Saldanha promoveu uma síntese abstrata de elementos arquitetônicos e urbanísticos populares. Na década de 1950, pintou principalmente paisagens urbanas, mas no lugar da temporalidade veloz e do constante ruído das grandes cidades modernas, a artista optou por retratar as fachadas silenciosas das históricas Ouro Preto e Salvador, criando a imagem de um passado pré-moderno. Na década de 1960, em uma ousadia experimental, a artista deu um salto rumo à abstração. A paisagem urbana foi sendo descontruída, antes do “derretimento” das cidades na tela, em um movimento de dissipação dos elementos geométricos sobre a superfície planar.
As obras de Saldanha nos permitem traçar um outro percurso para a história da abstração brasileira, que não se origina na Bienal construtiva de 1951, mas na observação da natureza e das culturas tradicionais. Há, portanto, um deslocamento do sentido hegemônico em que a geometria assume seu sentido mais puro, uma medida da terra – logo, uma medida da vida. Por fim, sua obra estendeu-se para o espaço. Saldanha instaurou uma pintura em campo ampliado que, ao saltar para fora da tela, ganhou espaço real e autonomia. Nas palavras da artista, “eu quis sair da parede, do limite da parede. E quis sair fora, quase que como uma espécie de liberdade maior”. Na série “Bambus”, produziu esculturas antropomórficas que evocam a cultura brasileira popular e aprofundam sua pesquisa cromática. Em outra série importante, “Ripas”, a artista desenvolveu um laboratório fragmentado e colorido em que tiras de madeira com tamanhos variados ficavam encostadas na parede, em relação que jogava com a arquitetura do espaço.
Ione Saldanha teve sua carreira amplamente reconhecida, recebendo em 1969 o prêmio de viagem ao exterior no 7º Resumo de Arte do Jornal do Brasil. Participou de mais de dez edições da Bienal Internacional de São Paulo, além de outras exposições coletivas como o “Panorama de Arte Atual Brasileira” no MAM-SP (1969, 1970 e 1975); “10ª Quadriennale di Roma” (1977); “2ª Bienal de Arte Coltejer”, Medellín (1970); “8º Salão Nacional de Artes Plásticas”, MAM Rio (1985); “Brasil/60 anos de arte moderna”, Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa (1982); “Forma/Suporte”, MAC Niterói (2003) e “Genealogias do contemporâneo”, MAM Rio (2010). Entre exposições individuais destacam-se “Bobinas”, MAM Rio (1971); “Ione Saldanha”, Instituto de Arquitetos do Brasil, Rio de Janeiro (1981); “Ione Saldanha”, Paço Imperial, Rio de Janeiro (1996); “Ione Saldanha: o tempo e a cor”, MAM Rio/MON/Fundação Iberê Camargo (2012) e “Ione Saldanha: a cidade inventada”, MASP (2021). Possui trabalhos em coleções importantes como MASP, MAC-USP e MAM-SP.
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